Em um cenário rural cada vez mais desafiador, onde o acesso a crédito, tecnologia e mercado nem sempre chega de forma igualitária aos pequenos e médios produtores e produtoras, o cooperativismo surge como uma poderosa ferramenta de transformação social e econômica. Mais do que uma simples união de esforços, as cooperativas representam um modelo de organização que valoriza o trabalho coletivo, fortalece comunidades e impulsiona o desenvolvimento regional de maneira justa e sustentável.
Esse movimento, que nasceu da necessidade de enfrentar dificuldades comuns e alcançar objetivos compartilhados, hoje mobiliza milhões de pessoas em todo o Brasil. São agricultores e agricultoras que, juntos, conseguem ir além das limitações individuais, conquistando melhores condições de produção, comercialização e qualidade de vida. No campo, cooperar é sinônimo de resistência, inovação e prosperidade.
Segundo o Anuário do Cooperativismo Brasileiro 2024, realizado pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), o país já reúne mais de 23 milhões de cooperados(as) ao todo, com destaque para o setor agropecuário, responsável pela maior parte das cooperativas em atividade – já são quase 1.200 unidades. Além de promover a inclusão produtiva, o cooperativismo também estimula práticas sustentáveis, a diversificação das atividades rurais e o fortalecimento das economias locais – elementos essenciais para a construção de um futuro mais equilibrado e responsável.
Cooperativismo e sustentabilidade caminham juntos no Cerrado
Esse potencial transformador do cooperativismo também se faz presente no bioma Cerrado, onde milhares de produtores(as) rurais buscam conciliar produtividade com responsabilidade ambiental. É nesse contexto que atua o Projeto Rural Sustentável – Cerrado, iniciativa que apoia pequenos e médios produtores e produtoras na adoção de tecnologias produtivas de baixa emissão de carbono, ao mesmo tempo em que fortalece suas capacidades de organização, acesso a mercados e geração de renda.
Nos estados de Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, o Projeto se conecta diretamente às práticas cooperativistas por meio de 48 Organizações Socioprodutivas (OSPs) parceiras, criando uma rede de conhecimento, inovação e cooperação que impulsiona o desenvolvimento sustentável na região. Uma dessas OSPs é a Cooperativa dos Agricultores Familiares do Município de Morrinhos (COOPERFAT), fundada em 1998 no município goiano com o objetivo de expandir o mercado rural para a venda coletiva do leite. Ao longo de seus 27 anos de existência, a cooperativa conseguiu acessar não só este mercado, mas também o de hortifruticultura.
Para a agricultora Carmelucia Helena Costa Tagliari, associada à COOPERFAT, em Morrinhos (GO), a cooperativa foi o que consolidou seu trabalho com a família. “A gente trabalha junto, eu, meu marido, meus filhos, meus irmãos. Produzimos frutas, polpas e ovos. Com a cooperativa, passamos a ter mais certeza de que o nosso negócio tinha futuro“. Ela relembra que, quando entrou na cooperativa, em 2010, a chegada de programas como o PNAE e o PAA foi o que abriu espaço para a comercialização de frutas e verduras. “Hoje vendemos para supermercados, restaurantes, escolas. Acho que a cidade inteira consome um pouco do que a gente produz”, resume, com orgulho. Além de produtora rural, Carmelucia também compõe a diretoria da COOPERFAT.
Já o presidente da cooperativa, Amarildo Lopes, destaca a atuação do cooperativismo como um elo fundamental entre o pequeno produtor e o mercado. “Diante das instabilidades do mercado, como aumento dos custos de produção, variações climáticas e exigências de rastreabilidade, a cooperação fortalece o poder de negociação dos agricultores”. Quanto à questão ambiental, segundo ele, muitos produtores e produtoras estão mais abertos à adoção de práticas sustentáveis após as ações promovidas pela COOPERFAT e parcerias como a do PRS – Cerrado. “Existe uma consciência ambiental crescente, impulsionada tanto por capacitações quanto pela preocupação com a preservação dos recursos para as próximas gerações”, conta.
Andando em direção ao Cerrado mineiro, no município de Abaeté, encontramos a Cooperativa dos Produtores Rurais de São Simão (COOPASS), que nasceu a partir de um grupo de pequenos(as) produtores(as) rurais que se uniu para enfrentar os desafios da produção leiteira na região. Desde então, a COOPASS atua diretamente na cadeia produtiva do leite – captando, transportando e disponibilizando apoio técnico especializado para uma análise de padrão sanitário durante a coleta. Tudo isso com o objetivo de se tornar um agente estratégico no desenvolvimento regional – socialmente, economicamente e ambientalmente.
Segundo os dados da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), o estado de Minas Gerais é o maior em número de cooperativas agropecuárias do país – totalizando 186. Esse dado destaca a importância da formação de organizações coletivas e também reflete no dia a dia da produção no campo. Para José Jurval Mendes, produtor rural e associado da COOPASS, cooperar é essencial: “A cooperativa é muito importante para o produtor. O ato de cooperar, de ter pessoas juntas para comprar e vender. É através desse ajuntamento que conseguimos melhorar a produtividade e o desempenho, principalmente para o pequeno produtor.”
Ao promover acesso a tecnologias mais eficientes e estimular práticas de conservação ambiental, as cooperativas se tornam aliadas fundamentais no enfrentamento das mudanças climáticas – um dos pilares do Projeto Rural Sustentável – Cerrado.
Na prática, iniciativas como o uso racional da água, o manejo adequado do solo, o plantio diversificado e a redução do uso de agrotóxicos vêm sendo cada vez mais incentivadas entre os(as) cooperados(as). Muitas dessas práticas têm sido viabilizadas com apoio técnico e institucional de programas como o PRS – Cerrado, gerando impactos positivos tanto no campo econômico quanto ambiental.
Saiba mais sobre o PRS – Cerrado: https://www.ruralsustentavel.org/
Na Amazônia, cooperativa une forças para diversificar a produção, gerar renda e acessar novos mercados
Na Amazônia, o cooperativismo surge como um elo entre produção, acesso a mercados e geração de renda aliada à conservação da floresta. Segundo dados obtidos, em 2023, no Encontro Brasileiro de Pesquisadores em Cooperativismo, são mais de 20 mil unidades produtivas vinculadas a cooperativas, na região Norte. Desse número, cerca de 83,1% têm como finalidade a comercialização coletiva – enquanto para 16,9% o trabalho conjunto é voltado para consumo próprio. Exatamente por isso, esse é um modelo de negócio que evidencia e aprimora os modos de vida e de produzir ancestralmente implementado por produtores e produtoras rurais amazônicos, que sempre encontraram na união uma forma de alcançar oportunidades de desenvolvimento, de forma sustentável.
Esse é o caso da Cooperativa Agrícola dos Empreendedores Populares de Igarapé Miri (CAEPIM), composta por mais de 150 associados e associadas, localizada no município de Igarapé Miri, a 143 km de Belém (PA). E é de lá que o presidente da cooperativa, seu Leubaldo Fonseca Costa, compartilha a história de mais 20 anos da organização e a cooperação na hora de produzir, comercializar e de interagir com os demais atores da região.“A cooperativa surge com essa intenção de fazer o processo de comercializar os produtos dos 152 associados e associadas. No início, em 2025, era difícil fazer a comercialização, principalmente do açaí. Tínhamos dificuldades na comercialização individual, porque o produtor ficava muito vulnerável financeiramente. Então, a partir do momento que começamos a fazer a comercialização coletiva, nós tivemos mais poder de negociar com as empresas e melhorar a questão do preço”, ele conta.
De acordo com o seu Leobaldo, a CAEPIM sempre busca olhar para as demandas individuais e coletivas do grupo – como a dificuldade de adquirir renda nos períodos de entressafra do açaí. A cooperativa trabalha há anos com o fruto, mas, há pouco mais de três anos, encontrou no PRS – Amazônia uma oportunidade de diversificar a produção com a cadeia produtiva do cacau. “O papel da cooperativa é justamente esse: estar sempre atento às necessidades do nosso quadro social, assim como as oportunidades de mercado e de comércio. A gente sempre tá buscando esses novos desafios, conhecimentos e capacitações”, ele conta.
Diversificando a produção, a preocupação antiga da cooperativa com a renda dos associados começa a perder espaço para as oportunidades de desenvolvimento coletivo através do cultivo, beneficiamento e comercialização do cacau. “O açaí tem um ciclo de 6 meses, então, nós temos 6 meses de carência na produção, vamos dizer assim. E isso nos traz um pouco de dificuldade, de manutenção financeira, principalmente. Então, é preciso buscar outras alternativas de diversificar a produção, como o cacau. Então, esse é o conhecimento que a gente tem trabalhado e socializado com o nosso quadro social”, ele fala.
As expectativas do seu Leobaldo com a parceria com o PRS – Amazônia são altas. É porque ele vê no Projeto um caminho para fortalecer a cadeia produtiva, quem já trabalha com o fruto e, ainda, destacar os diferenciais da cooperativa. “A gente aproveita a oportunidade do Projeto para fazer o fortalecimento dessa cadeia, com uma linha de produção mais forte e organizada. A gente quer produzir cacau, mas quer produzir de uma forma diferente, onde a gente garanta tanto o aumento da produtividade, quanto a qualidade e o sustento das famílias, com respeito ao meio ambiente”, ele finaliza.
É dessa forma que o presidente e os mais de 150 associados e associadas, que compõem a CAEPIM, vêm superando os desafios diários nos últimos 20 anos. A cooperação é a essência do cooperativismo, e a forma mais eficaz de identificar as fortalezas internas e oportunidades de mercado que garantam não apenas o desenvolvimento da cooperativa, mas também de cada associado.
Um dos objetivos do Projeto no estado do Pará é oferecer às organizações uma Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER), adaptada ao contexto local e produtivo, que dialogue com seus objetivos individuais e coletivos. Além de uma assistência técnica organizacional com foco em potencializar a produção, ampliar o acesso a novos mercados e gerar renda de forma sustentável. Esse foi um dos caminhos encontrados pelo Projeto de fortalecer o cooperativismo, os modos de vida tradicionais e a produção sustentável na Amazônia, impulsionando a geração de renda coletiva combinada ao respeito aos recursos naturais e saberes locais.
No Pará, o PRS – Amazônia trabalha com as cadeias produtivas do açaí e do cacau, desde o cultivo e extração até a comercialização. Na cadeia do cacau, a parceria é com 4 organizações locais e mais de 190 famílias produtoras e agroextrativistas que as compõem – muitas delas lideradas por mulheres e jovens e pertencentes a comunidades tradicionais. Além disso, com a extensão do projeto, 3 novas organizações da cadeia do cacau, junto de suas 170 famílias, se preparam para somar ao quadro de organizações parceiras.
Saiba mais sobre o PRS – Amazônia: https://prsamazonia.org.br/
Veja algumas fotos atividades desenvolvidas com a cooperativa