Proteger o Cerrado para garantir o acesso à água no Brasil

Ameaçado pelo desmatamento, são necessárias medidas incisivas para conter as degradações ambientais no bioma conhecido como berço das águas

Os fluxos de água doce são indispensáveis para a sobrevivência humana. Rios, lagos e riachos estão presentes na economia, nas manifestações culturais, na construção social, na saúde da natureza e atravessam profundamente a política. Apesar da centralidade, os ambientes aquáticos são os ecossistemas mais degradados no mundo, mostram diversos estudos.

No contexto do Cerrado, é possível indicar que essa degradação é marcada pelo desmatamento, incêndio florestal, contenção de água para barragens, contaminação por efluentes e químicos e gravidade dos efeitos das mudanças climáticas. Para reverter esse panorama no berço das águas do Brasil, é preciso incluir os fluxos d’água no debate de conservação, promover a proteção legal das águas superficiais e subterrâneas — aplicando instrumentos eficazes de planejamento, gestão e governança — e cuidar responsavelmente das vegetações próximas aos cursos fluviais.

O Programa Rural Sustentável (PRS) entende que, para contribuir com a saúde dos ecossistemas terrestres e aquáticos, é urgente incentivar a agropecuária sustentável. Para cumprir com essa meta, trabalha em conjunto com as populações nos biomas onde atua, incluindo o Cerrado. Por meio do Projeto Rural Sustentável – Cerrado, concilia as especificidades no território cerratense com a implementação de tecnologias de baixa emissão de carbono, fortalecendo as práticas agrícolas e pecuárias de reduzido impacto ambiental.

Nesta matéria, flutuaremos pelas veias hídricas no coração do Cerrado, refletindo sobre sua importância para a segurança hídrica dos ecossistemas brasileiros, principais ameaças e caminhos para conservação de seus recursos fluviais e de suas águas subterrâneas.

 

Cerrado, o coração que bombeia as águas do Brasil

O Cerrado é lar de diversas nascentes e é responsável parcialmente pela recarga hídrica — superficial e subterrânea — das principais bacias hidrográficas no Brasil e na América do Sul.

Das doze bacias no território brasileiro, oito nascem no Cerrado: bacia Amazônica (incluindo rios como Xingu, Madeira e Tapajós); Tocantins-Araguaia (considerada a maior bacia inteiramente brasileira); a Atlântico Nordeste Oriental; bacia do Parnaíba; bacia do São Francisco; bacia Periférica Atlântica; bacia do Paraná; e bacia do Paraguai.

A magnitude das águas do Cerrado vão além das águas superficiais pelas quais é responsável. Por baixo da terra, abriga três dos principais aquíferos do país: Bambuí, Urucuia e Guarani (o segundo maior do mundo!). Essa riqueza de águas nos lençóis freáticos depende de alguns fatores, como as raízes profundas da vegetação cerratense, que capta água da chuva, estoca e abastece os gigantes aquíferos e as diversas nascentes. 

As águas superficiais e subterrâneas do Cerrado, assim como os ecossistemas dependentes delas, são fundamentais para a resiliência dos biomas brasileiros e para todo o equilíbrio ambiental na América Latina. Dados da WWF Brasil indicam que, além de fornecer 40% de toda a água doce no Brasil, 90% da população brasileira consome energia produzida por hidrelétricas cujas águas nascem no Cerrado.

Entretanto, esse cenário pode ser radicalmente alterado diante do atual contexto climático: o bioma pode perder 34% de seu volume de água até 2050. É o que indica o estudo liderado pelo diretor-executivo do Instituto Cerrados, Yuri Salmona e apoiado pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN): Um Futuro Preocupante para os Fluxos dos Rios no Cerrado Brasileiro Provocado por Mudanças no Uso da Terra e no Clima (traduzido do inglês A Worrying Future for River Flows in the Brazilian Cerrado Provoked by Land Use and Climate Changes).

A pesquisa analisou 81 bacias hidrográficas no Cerrado, a partir do recorte histórico de 1985 a 2022. 88% das bacias apresentaram redução na vazão — 44% dessa diminuição vem acontecendo por conta das mudanças climáticas, ao passo que as mudanças do uso do solo, ligadas à agropecuária, são responsáveis por 56% desse cenário. O desmatamento para aplicação dessas práticas também interfere diretamente no ciclo hidrológico regional, afetando a evapotranspiração e o fluxo pluvial. 

As previsões científicas apontam para uma preocupante situação ambiental do Cerrado, decorrente do uso indiscriminado dos recursos hídricos e da redução da vegetação nativa. Caso não haja mudança efetiva para conter esses dois agentes mencionados, a biodiversidade, as populações no Cerrado e a economia brasileira — especialmente o setor agropecuário — sentirão diretamente as consequências. As seguranças energética e hídrica de todo o país também serão afetadas.

 

Para conservar as águas do Cerrado, é preciso uma agropecuária sustentável

O Programa Rural Sustentável (PRS) sabe da responsabilidade ambiental do setor agropecuário e reconhece que a agricultura e pecuária são importantes atores nessa jornada, ocupando uma posição fundamental para a transição sustentável no setor produtivo.

Desde 2019, sua atuação no Cerrado incide diretamente na proteção da vegetação nativa e no uso consciente dos recursos naturais — incluindo os recursos hídricos. Ao promover e implementar tecnologias de baixa emissão de carbono, incentiva a recuperação de áreas degradadas e impede a abertura de novas áreas para cultivo. O PRS tem como missão promover o desenvolvimento social e econômico, alinhado com as necessidades humanas e da natureza, e garantir dignidade e qualidade de vida.

As mudanças climáticas, o aumento local da temperatura, desmatamento e incêndios florestais vêm alterando o regime regional de chuvas, o que interfere significativamente nos padrões naturais de recarga dos lençóis freáticos e na frequência e intensidade de secas. A contaminação por efluentes e químicos, por outro lado, envenenam diretamente os fluxos d’água superficiais e subterrâneos, ao passo que a construção de barragens interfere diretamente na saúde ecossistêmica.

Frear os agentes emissores de gases do efeito estufa e de degradação, proteger as nascentes e os grandes fluxos d’água e conservar e recuperar a vegetação nativa são tarefas fundamentais para interromper e reverter o atual contexto ambiental e climático. Assim, é possível contribuir com a qualidade de vida das famílias nas zonas rurais e urbanas e proteger a biodiversidade cerratense.

 

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